Há menos de 2 anos atrás o Brasil inteiro foi surpreendido, ou não, pelo caso da ZARA e algumas outras marcas contratarem oficinas que prestam serviços em regime de “escravidão” para a produção de suas peças. Está lembrado?
Durante o SPFW, a principal semana de moda do país –INFELIZMENTE– mais uma oficina foi descoberta com 28 trabalhadores bolivianos que não sabiam que aqui existe a “Lei Áurea”. Se é que realmente existe.
A matéria é da Repórter Brasil, que acompanhou de perto a operação do governo:
Fiscalização realizada na terça-feira, 19/03, resultou na libertação de 28 costureiros bolivianos de condições análogas às de escravos em uma oficina clandestina na zona leste de São Paulo. Submetidos a condições degradantes, jornadas exaustivas e servidão por dívida, eles produziam peças para a empresa GEP, que é formada pelas marcas Emme, Cori e Luigi Bertolli, e que pertence ao grupo que representa a grife internacional GAP no Brasil. O resgate foi resultado de uma investigação de mais de dois meses, na qual trabalharam juntos Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e Receita Federal.
Os costureiros, todos vindos da Bolívia, trabalhavam e moravam na oficina clandestina, cumprindo jornadas de, pelo menos, 11 horas diárias. A oficina repassava a produção para a Silobay, empresa dona da marca Coivara baseada no Bom Retiro, também em São Paulo, que, por sua vez, encaminhava as peças para a GEP. A intermediária também foi fiscalizada, em ação realizada na quinta-feira (21).
Tanto o MPT quanto o MTE e a Receita Federal consideraram a “quarteirização” uma fraude para mascarar relações trabalhistas. Para os auditores fiscais Luís Alexandre Faria e Renato Bignami e a procuradora do trabalho Andrea Tertuliano de Oliveira, todos presentes na fiscalização, não há dúvidas da responsabilidade da GEP quanto à situação degradante em que foram encontrados os trabalhadores da oficina clandestina.
Aliciados no país vizinho, os imigrantes já começaram a trabalhar endividados, ficando responsáveis por arcar com os custos de transporte e de entrada no país. As dívidas se acumulavam e aumentavam com a entrega de “vales”, adiantamentos descontados do salário. Mesmo os que administravam a oficina se endividavam, acumulando empréstimos para compra de novas máquinas e contratação de mais costureiros.
Entre os problemas detectados pela fiscalização na oficina clandestina estão desde questões de segurança, incluindo extintores de incêndio vencidos, fiação exposta e botijões de gás em locais inapropriados, com risco agravado pela grande concentração de tecidos e materiais inflamáveis na linha de produção, até problemas relativos às condições de alojamento e trabalho. Os trabalhadores viviam em quartos adaptados, alguns com divisórias improvisadas, outros dividindo espaço em beliches. Além disso, alimentos foram encontrados armazenados junto com produtos de limpeza e ração de cachorros.
O grupo trabalhava das 7h às 18h, de segunda à sexta-feira, com uma hora para refeições. Aos sábados, os próprios empregados cuidavam da limpeza e manutenção do local. Todos ganhavam por produção, recebendo cerca de R$ 4 e R$ 5 para costurar e preparar peças das grifes que abastecem os principais shoppings do país. “Quanto mais peças costurarmos, mais dinheiro ganhamos, então preferimos não parar”, afirmou um dos resgatados durante a operação. Mesmo com a presença dos fiscais, todos continuaram costurando, só parando quando as máquinas foram lacradas e a produção oficialmente interrompida.
Um dia após a fiscalização, representantes da GEP concordaram em assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com pagamento de R$ 10 mil para cada uma das vítimas por danos morais individuais, além de mais R$ 450 mil por danos morais coletivos, valor que deve ser repartido e encaminhado ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo e a uma organização da sociedade civil que trabalhe com imigrantes. Além da indenização por danos morais, os empregados resgatados receberão também, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, verbas rescisórias de, em média, R$ 15 mil, valor que pode chegar a R$ 20 mil conforme cada caso. Eles também terão a situação regularizada, com acesso à seguro-desemprego e registro adequado em carteira.
Até quando essa prática vai ser comum na indústria da moda? O pior é quando converso com o pessoal do ramo e dizem, conformados com a situação, “Isso é comum aqui e no mundo inteiro.”, “Você vai fazer o quê? Deixar de comprar nessas marcas?”, “Não tem o que fazer!”.
Será que não tem o que fazer?
Pense nisso.
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